quinta-feira, 30 de julho de 2020

"O conceito de branquitude: reflexões para o campo de estudo"

O CONCEITO DE BRANQUITUDE: REFLEXÕES PARA O CAMPO DE ESTUDO

Priscila Elisabete da Silva 
(excertos)


     A ORIGEM DO CONCEITO DE BRANQUITUDE

     Antes de caracterizar o conceito de branquitude, cabe apresentar, ainda que brevemente, um histórico sobre seu surgimento.
     Os estudos críticos da branquitude nasceram da percepção de que era preciso analisar o papel da identidade branca enquanto elemento ativo nas relações raciais em sociedades marcadas pelo colonialismo europeu. Percepção esta que esteve presente nos estudos de intelectuais como W.E.B. Du Bois (1920, 1935); Frantz Fanon (1952), Albert Memmi (1957), Steve Biko (1978) e Alberto Guerreiro Ramos (1957), hoje compreendidos como precursores dos estudos sobre a branquitude (CARDOSO, 2008; 2010 e 2014). Tais intelectuais, em diferentes contextos históricos e sociais, chamaram a atenção para os efeitos da colonização e do racismo na subjetividade não só do negro, mas, sobretudo, do branco. Leitura que desafiava à interpretação unívoca a qual via o negro como "objeto de estudo", "tema de estudo" privilegiado para compreensão das relações raciais.
     Seguindo esse lastro, na década de 1990, intelectuais norte-americanos iniciaram uma reflexão sistemática sobre o fenômeno da branquitude e seus efeitos. O tema difundiu-se rapidamente por diferentes áreas de estudo (direito, arquitetura, geografia, antropologia, sociologia, psicologia). "A formulação e a aplicação do conceito de branquitude alterou o modo como se pesquisava a categoria "raça" na sociedade estadunidense" (CARDOSO, 2008, p. 174). A partir de então, o branco emerge como "objeto de análise" para compreensão da dinâmica das relações raciais deste país. Esforço que deu origem ao que ficou conhecido por

[...] acumular uma quantidade substancial de conhecimento, explorando o significado da análise da branquidade como uma construção social, cultural e histórica. Esse trabalho se caracterizou por várias tentativas para situar a branquidade como uma categoria racial e analisá-la como um lócus de privilégio, poder e ideologia. Além disso, esse trabalho procurou examinar criticamente de que modo a branquidade, como identidade racial, é experenciada, reproduzida e tratada pelos homens e mulheres brancos que se identificam com suas pressuposições e valores. (GIROUX, 1999, p. 101).

     Cardoso L. (2008), Ruth Frankenberg (2004) e David R. Roediger (2004) destacam o diálogo desses pesquisadores com os estudos culturais e com a teoria feminista. Segundo Cardoso L. (2008), os estudos críticos da branquitude nos Estados Unidos apresentam duas vertentes principais: "a primeira linha de estudos críticos da branquitude propõe a reconstrução da raça branca, mantendo-se uma sociedade racializada com a supressão das hierarquias sociais", já à segunda "subjaz o projeto de uma sociedade não racializada". (CARDOSO, 2008, p. 175). Nas palavras do autor:

[Na primeira linha] sustenta-se que o ideal do ativismo e da teoria anti-racista consiste em suprimir a identidade racial branca em sua inclinação subjugadora, forjando uma identidade racial anti-racista e isenta de culpa [...]. A proposta dessa linha de estudos seria resignificar e reconstruir a identidade racial branca que, sem deixar de ser branca, deixaria de possuir traços racistas. Não se pressupõe, portanto, a supressão da diferença e sim o fim da hierarquia entre os diferentes que resulta no favorecimento de uns em detrimento de outros [...]. (CARDOSO, 2008, P. 174).

     Já a segunda,

[...] sustenta que a identidade racial branca assim como foi construída pode ser desconstruída, defendendo a abolição da ideia de raça branca [...]. Parte-se do pressuposto de que a pertença étnica e racial branca é uma construção histórico-social e a resolução dos problemas sociais advindos dessa identidade cultural resolve-se com sua supressão. Esta linha de teóricos críticos não está convencida da possibilidade de expurgar o traço racista da identidade racial branca, portanto, propõe a abolição da branquitude e, por via de consequência, a abolição da negritude. (CARDOSO, 2008, p. 174-175).

     O que está de fundo tanto numa discussão quanto na outra é a compreensão e superação dos efeitos da branquitude nas relações sociais contemporâneas. Os resultados dos estudos empreendidos até então demonstram que a branquitude deve ser interpretada como elemento resultante da estrutura colonialista que, por sua vez, "configurou, até hoje, apesar do sucesso dos movimentos anticolonialistas da libertação" (WARE, 2004, p. 08); a branquitude é assim entendida como resultado da relação colonial que legou determinada configuração às subjetividades de indivíduos e orientou lugares sociais para brancos e não brancos. Conforme assinala o sociólogo Valter Silvério: 

Esta consciência silenciada ou experiência branca pode ser definida como 'uma forma sócio-histórica de consciência' nascida das relações capitalistas e leis coloniais, hoje compreendida como 'relações emergentes entre grupos dominantes e subordinados'. Essa branquitude como geradora de conflitos raciais demarca concepções ideológicas, práticas sociais e formação cultural, identicadas com e para brancos, como de ordem 'branca' e, por consequência, socialmente hegemônica. (SILVÉRIO, 2002, p. 240-241).

     Ao analisar historicamente tal fenômeno, esse sociólogo marca o processo de sua formação a partir da relação entre colonizador e colonizado:

O encontro com o 'outro' (denominado índio, escravo, preto, negro, nomenclaturas estabelecidas para justificar sua desumanidade, invisibilidade e coisificação), não incluído como membro social, permitiu aos colonizadores anglo-europeus perceberem a branquitude como uma representação de identidade e ponto de referência para legitimar a distinção e a superioridade, assegurando assim sua posição de privilégio. (SILVÉRIO, 2002, p. 241).

     No mesmo sentido, o pesquisador Lúcio Otávio Alves Oliveira (2014), ao refletir sobre o processo de construção da identidade branca e suas implicações subjetivas, afirma que, em sociedades multiculturais, é possível identificar expressões da branquitude tendo em vista que o branco constitui sua identidade na oposição ao 'Outro'. Em suas palavras: "a branquitude emerge dissecando no outro aquilo que lhe parece estranho e indesejável". (OLIVEIRA, 2014, p.43). O 'Outro' (leia-se o não branco) torna-se, assim, balizador da identidade branca; ela, por sua vez, passa a ser reafirmada na oposição com o não branco. Processo que pode ser interpretado tanto no ponto de vista da necessária diferenciação para constituição da identidade, como pela perspectiva danosa apontada por Bento como "falsa projeção", isto é:

[...] o mecanismo por meio do qual o sujeito procura livrar-se dos impulsos que ele não admite como seus, depositando-os no outro. Aquilo, portanto, que lhe é familiar, passa a ser visto como algo hostil e é projetado para fora de si, ou seja, na'vítima em potencial'.(BENTO, 2009, p. 38).

     Nas sociedades marcadas pela herança colonialista, o negro é, necessariamente, essa "vítima em potencial", ou seja, aquele que é interpretado pelo branco como sua antítese (CARDOSO, 2014). Esse mecanismo perverso foi concebido para justificar uma hierarquia social pautada na ideia de superioridade racial. Característica das relações colonialistas, essa estrutura tem se mostrado capaz de resistir a diferentes contextos sociais sem perder sua essência, isto é, mantendo os privilégios e lugar de poder de um grupo étnico-racial específico autodeclarado "branco",
     Por ter sua histórica marcada pela expansão colonialista, podemos  afirmar a existência da branquitude em nossa sociedade (CARDOSO, 2014). Fato que muito recentemente tem sido analisado de maneira mais sistemática. Liv Sovik, estudiosa do tema na sociedade brasileira, destaca a importância desses estudos:

O interesse em analisar a branquidade não é a de traçar o perfil de um grupo populacional até então ignorado, mas de entender como, há tanto tempo, não se prestou atenção aos valores que o definem. O estudo da branquidade pode esclarecer as formas de suavizar os contornos de categorias raciais enquanto se mantém as portas fechadas para afrodescendentes. (SOVIK, 2004, p. 384).

     Como demonstrou o pesquisador Lourenço Cardoso (2008, 2010 e 2014), no Brasil os estudos sobre branquitude emergiram de forma sistemática a partir do ano 2000. O levantamento desses estudos indica as áreas de conhecimento que, primeiramente, preocuparam-se com o tema (sociologia, psicologia social e comunicação social). Os primeiros intelectuais que se ocuparam em entender o papel da identidade branca nas relações sócio-raciais em nosso país foram Alberto Guerreiro Ramos, Edith Piza, César Rossato e Verônica Gesser, Maria Aparecia Bento e Liv Sovik (CARDOSO, 2008).
     Esses primeiros trabalhos lançaram as bases para a interpretação do conceito de branquitude em nossa sociedade. Promoveram um importante deslocamento na interpretação sobre estudos raciais até então vigentes a partir da: a) inserção do debate no Brasil pela relação teoria-pesquisa social; b) problematização do viés interpretativo recorrente nos estudos sobre relações raciais, ao inverterem o sentido e colocarem o foco dos estudos na identidade racial branca; c) revisão dos conceitos fundamentais à interpretação de nossa sociedade como, por exemplo, mestiçagem e democracia racial, levando em consideração aspectos da branquitude; d) problematização da identidade racial branca como elemento de análise na produção intelectual. Além de contribuírem ao lançarem luz sobre questões até então majoritariamente interpretadas a partir de teorias e conceitos centrados nos arcabouços antropológicos e sociológicos.
     A partir da primeira década do século XXI, o tema branquitude tem chamado cada vez mais a atenção de novos pesquisadores, o que tem fortalecido o tema, constituindo-o como campo de pesquisa reconhecido por seus pares. A "atual geração" de pesquisadores da branquitude no Brasil tem contribuído não só para consolidar questões apresentadas pela "geração anterior", como também para abrir novos caminhos, tanto para o adensamento do conceito quanto para a construção de uma teoria sobre o tema. São também estudos que nos auxiliam a entender as características do conceito e suas implicações em nossa sociedade.

                      
                                  
MÜLLER, Tânia Mara Pedroso. CARDOSO, Lourenço.

quarta-feira, 29 de julho de 2020

No racismo, tudo é política...

No racismo, tudo é política...

Postado originalmente no meu Facebook, no dia 26/07/2020.

Aí tu vai ler os comentários de uma postagem sobre Racismo, e a pessoa argumenta que AGORA, tudo tem haver com política... como se racismo tivesse lado...
Queridão, sempre foi sobre política!! Desde a Bula Dum Diversas, do Papa Nicolau, em 1454, dando poderes plenos ao Rei de Portugal para invadir o Continente Africano, expropriar riquezas, terras e vidas. Desde ali, quando a disputa de poder entre Reis e Igrejas era explícito, e seus acordos eram escusos, as coisas já eram políticos, e tinham lado. E nem igreja Católica nem os Portugueses estavam do nosso lado...
Ainda era política todo o processo de invasão, colonização e extermínio dos Povos Tradicionais Indígenas, que além de morrer na bainha da espada e pós estupros, morriam das doenças que os fedidos e contaminados invasores traziam...
Seguiu sendo política na criação de todas as leis do período de colonização e império, que mantiveram e ampliaram o processo de tráfico escravização africana e indígena, impediram ou dificultaram ao extremo o acesso a liberdade, à escolarização formal, a posse de terras e propriedades de moradia, comerciais e rurais. Que mudou nossos nomes e sobrenomes originais, acabou com documentos de ingresso que certificassem sua procedência real, ou seja, nossa ancestralidade. Que impôs uma língua única, uma religiosidade única, uma cultura única como aceitáveis e praticàveis, negando nossa história múltipla e milenar.
Sim, ainda era política quando grupos como do Barão de Santo Ângelo defendia que dar liberdade aos escravizados iria falir o país, pois não haveria mão de obra para servir aos brancos, que preguiçosamente se pegavam a fazer determinadas tarefas, tidas como braçais e menos humanizadas.
E segue hoje sendo política, quando a branquitude não consegue segurar seu racismo quando veem não-brancos ocupando lugar de protagonismo, como donos de empresas afrocentradas, mídias, judiciário e outros postos públicos de alto escalão, seus restaurantes, universidades, shoppings e aviões de 1a classe. Tudo que dê visibilidade, protagonismo ou fama a pessoas que não sejam brancas lhes atinge de um jeito que babam ódio nas Redes sociais e mídias, esfregando na nossa cara aquele NÃO LUGAR, um espaço não destinado pra nós, na organização racista social...
É, sempre foi e sempre será política! E estamos aprendendo a jogar este jogo... o seu jogo está sendo desvendado, pois nós viemos para ocupar estes espaços e usar as suas armas.
Acostumem-se!!
Estamos criando a próxima geração pra reagir, de todas as formas possíveis contra suas políticas racistas!! Acostumem-se conosco, aqui é em todos os lugares!!
Patrícia Pereira

TÁTICAS E ESTRATÉGIAS PARA PENSAR O SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL NO PRESENTE: O QUE TEM O RAP COM ISSO?

O texto de Mari Cristina de Freitas Fagundes sobre Rap, Sistema jurídico e sujeição criminal é o que leremos hoje.
Referência: FAGUNDES, Mari Cristina de Freitas. Táticas e estratégias para pensar o sistema de justiça criminal no presente: o que tem o rap com isso? Norus: Novos rumos sociológicos, v. 4, n. 5, p. 89-101, 2016.


Dossiê 

TÁTICAS E ESTRATÉGIAS PARA PENSAR O SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL NO PRESENTE: O QUE TEM O RAP COM ISSO? 

Mari Cristina de Freitas Fagundes
Graduada em Direito. 
Especialista em Direito Penal e Processual Penal. 
Mestre em Sociologia pela Universidade Federal de Pelotas. 
Professora na Faculdade Anhanguera Educacional de Pelotas. 


RESUMO 

Este trabalho, fruto de uma dissertação de mestrado, tem como premissa engendrar alguns questionamentos frente ao sistema jurídico contemporâneo, especialmente ao sistema de justiça criminal, a partir de entrevistas realizadas com compositores de Rap, na cidade de Pelotas/Rio Grande do Sul/Brasil. A pesquisa foi realizada no ano de 2014 e 2015, com compositores locais, sendo possível perceber a subdivisão do Rap em “gerações”, levando em consideração as abordagens que destacam em suas composições. Além disso, percebi nas entrevistas a incessante crítica ao sistema jurídico e as prévias rotulações existentes pelos agentes estatais àqueles considerados “anormais”. Assim, discuti as subjetivações e subjetividades construídas pelo Rap local e pelo sistema de justiça criminal, e como elas reverberam nas verdades produzidas e reproduzidas socialmente. Para alicerçar-me teoricamente, baseei-me em algumas produções de Michel Foucault, em autores da sociologia da violência, juristas e em estudos que dedicam atenção ao Rap. Palavras-Chaves: Rap pelotense; Sistema jurídico; Pesquisa de campo; Discurso; Sujeição criminal. 


TACTICS AND STRATEGIES TO THINK THE CRIMINAL JUSTICE SYSTEM IN THIS: WHAT HAS THE RAP WITH THAT? 

ABSTRACT 

This work, the result of a master's thesis, has the proposition to generate some questions facing the legal contemporary system, especially the criminal justice system, from interviews with composers of rap in the city of Pelotas/Rio Grande do Sul/Brasil. The research was conducted in 2014 and 2015, with local composers, and it is possible to realize the subdivision in the Rap "generations", considering the approaches that excel in their compositions. Furthermore, we note in the interviews the continuous criticism to legal system and the pre-existing labels by the state agents for those considered "abnormal". Thus, discusses the subjectivities and subjectivities built by local Rap and NORUS – v4, n.5, jan - jul 2016. 103 the criminal justice system, and how they reverberate in the truths produced and reproduced socially To be based in theory, it relied on some productions of Michel Foucault, sociology and anthropology and legal studies devote attention to Rap. Key words: Rap Pelotas; Legal system; Field research; Speech; Criminal subjection. 


     INTRODUÇÃO 
     Em tempos em que uma das grandes batalhas vividas é contra a violência, falar sobre ela toma dimensões bastante peculiares. Diz-se isso, porque através das representações criadas na e pela mídia (PORTO, 2009), algumas verdades passam a viger em sociedade sem maiores questionamentos. Um dos mecanismos de contenção, que assegura certa estabilidade social é o direito. Pensando especificamente em violência ou crime, o direito penal e seus mecanismos são os primeiros artefatos a serem pensados. “As leis não tem efetividade”, “só são feitas para bandido”, “bandido bom é bandido morto”, “redução da maioridade penal já” entre outros, são jargões recorrentes na sociedade contemporânea e repercutem na lógica jurídica. 
     Foi questionando essas verdades e suas potencialidades, que se dedicou à pesquisa empírica, articulando a arte e o sistema de justiça criminal, desenvolvida através da dissertação de mestrado, intitulada “Táticas e estratégias para desestabilizar certezas e questionar verdades no presente: O Rap pelotense e seu discurso de Resistência ao Sistema de Justiça Criminal” (FAGUNDES, 2015), defendida no Programa de Pós-graduação em Sociologia, da Universidade Federal de Pelotas/RS.
Para a sua elaboração, efetuei entrevistas semiestruturadas com rapper’s da cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil, a fim de perceber como esses sujeitos entendiam o sistema de justiça criminal e como o representavam, seja nas entrevistas ou nas letras de Rap que também foram analisadas.
     Atravessada pelos estudos foucaultianos, por alguns teóricos da sociologia da violência, por estudos históricos do Hip-Hop e do Rap, mais precisamente, bem como por alguns juristas, efetuei um mergulho histórico, analisando a proveniência do Rap e do sistema de justiça criminal, os inúmeros embates de forças de poder e saber e a consequente criação de subjetividade por ambos, buscando perceber como nos tornamos aquilo que somos enquanto sujeitos pertencentes de uma sociedade de normalização; o quanto o sistema de justiça criminal é um importante criador de subjetividades e o quanto nomeia saberes outros como subalternos, “sujeitados”. 
     Através da referida pesquisa, cheguei ao discurso de “Resistência” ao sistema de justiça criminal. Tal discurso foi sustentado pelos enunciados “juventude”, “viver na neblina” e “virtualidades”. Para o desenvolvimento do presente artigo, buscando uma delimitação A dinâmica das relações raciais: dados, abordagens e intersecções 104 metodológica, abordarei o enunciado “Virtualidades”, destacando os diferentes atravessamentos que lhe sustentam nas enunciações do Rap e a sua íntima ligação com o sistema de justiça criminal. 
     Visando efetuar uma sistematização metodológica, dividirei o presente artigo em três subitens. Inicialmente realizarei uma contextualização histórica do Rap e como é possível pensá-lo como um artefato cultural para falar do/sobre/para o sistema de justiça criminal. Posteriormente, fundamentada em alguns escritos de Michel Foucault, Nietzsche, juristas e sociólogos da violência, buscarei olhar para algumas verdades jurídicas, destacando as suas potencialidades e abstrações. Por fim, trarei o enunciado “Virtualidades” a fim de destacar a fala de alguns rapper’s locais e o seus olhares ao sistema de justiça criminal. Para enfrentar tais asperezas, é que convido o leitor a mirar essa escrita.

     ENTRE RIMAS, BITS E RESISTÊNCIAS: UM OLHAR AO RAP PELOTENSE 

     Diferente do que se sustenta em projetos de políticas públicas, em programas sociais etc, não parto do pressuposto de que o Rap “salva”; de que ele é um importante mecanismo para resgatar jovens da violência, da criminalidade entre tantos outros jargões que nos atravessam. Acredito, sim, que essa pode ser uma das ramificações do Rap na atualidade, um ritmo cultural atravessado por inúmeros embates, mas que não pode ser reduzido a um “isso” ou “aquilo”. 
     Nessa sequência, e diante da pesquisa empírica realizada, não afirmo que o Rap é “só” contestação ou que na atualidade o Rap deixou de contestar, porque se inseriu no mercado cultural. Tais afirmativas, por si só, já causam estranheza, pois tendem a simplificar um ritmo musical construído há mais de 30 anos, na cidade de Pelotas, atravessado por diversas modificações, sejam legais, institucionais, culturais etc. 
     Após entrevistar oito compositores do rap local, pude perceber a complexidade da cultura Hip-Hop. O embate de forças existentes dentro da cultura e o quanto isso é um importante mecanismo para que o Rap, atualmente, possa ser visto como um mecanismo de “resistência”. 
     Através da pesquisa empírica realizada no ano de 2014 no município referido, tive a oportunidade de verificar que o rap emergiu nessa cidade no início da década de 80. Com o passar dos anos, seus compositores foram conquistando espaços e tomando maior visibilidade na cidade. Os temas abordados nas letras também foram se modificando. Diante dessas mudanças, a própria cultura Hip-Hop tomou diferentes segmentos. Hoje, seus componentes afirmam existir três gerações do Rap local: uma formada por componentes da primeira geração, situada entre a década de 80 e 90, onde entrevistei Ligado Branco Radial, Jair Brown, Eduardo Amaro Radox; uma segunda geração, da década de 90 aos anos 2000, analisada através dos ditos de Gagui IDV e Luiz Vagner e, uma NORUS – v4, n.5, jan - jul 2016. 105 atual, onde pude conversar com Pok Sombra, Garcez e Zudzilla, todos compositores e intérpretes do Rap. 
     As três gerações ainda são ativas, produzindo rimas e causando sonoridades múltiplas. A diferenciação entre elas se dá através do conteúdo veiculado em suas rimas, as formas como se valem para a produção ou ainda, os meios em que disponibilizam o seu conteúdo. Importante destacar que a cultura Hip-Hop, oriunda dos guetos novaiorquinos, teve como uma de suas ramificações a contestação à vulnerabilidade social, as discriminações raciais e as disparidades sociais pulsantes socialmente. Dessa forma, uma das ideias que se possui do Rap é que este seria um veículo responsável pela a “educação” de jovens. 
     Entretanto, com a tomada de espaços que o Rap vem ocupando com o passar dos anos, a inserção no mercado cultural, muitos sujeitos pertencentes a cultura, aduzem que o Rap atual deixou de ser um veículo de “informação” e “educação”, pois os temas veiculados abordam, por vezes, drogas, mulheres entre outros itens, rechaçados por algumas vertentes. Os componentes da primeira geração do Rap pelotense, por exemplo, tendem a argumentar que os componentes da última geração, não mais contestam, pois teriam perdido o “que político” que o sustentava quando de seu surgimento no Brasil. Nesse sentido: 

                                   [...] hoje em dia ele tá mais destruindo do que levantando, tá ligado, levando autoestima. Hoje em dia o
                                       Rap que tá aí ele prega pra ti beber, fumar e foda-se. Ele não tá preocupado com nada, tá ligado? Até
                                 porque a maioria que hoje faz não vivenciou, não vem do sofrimento, então tá, até tão sendo verdadeiros
                                com eles, mas o cara que vem de uma outra geração, não tem como se identificar. (Ligado Branco
                                Radical – componente da Primeira geração). 

     Em outro sentido, advém o posicionamento dos componentes da terceira geração: 

E se tu é realmente um protestante, um revolucionário, do próprio Rap ou da política, tu tem que te atualizar perante a situação que te cerca à tua volta, tá ligado? E se o discurso pesado, de frente, não tá funcionando, muda! Muda irmão! O que interessa é que essa informação precisa chegar, de uma maneira ou de outra, por uma pessoa ou por outra. Ah, o cara tem que ser preto, tem que usar uma touca, tem que usar bigode e tem que falar só do crime encima do palco? Não, cara! Não precisa, tá ligado? Não tem porque, não tem como; a parada é mais plural, precisa ser mais plural pra mais pessoas entenderem o que a gente tá querendo dizer, porque hoje em dia tu falar pra periferia o que a periferia já sabe, é redundante. Eles preferem o Funk, que eles falam de um carro que ele vai ter que lá na internet pesquisar o nome do carro que o funkeiro falou, do que tu falar que tem um cara na esquina fumando pedra. O pai do cara fuma pedra, tá ligado? Acabasse de perder a chance, acabasse de perder a oportunidade. (Zudzilla – componente da Terceira geração). 

     Notei, então, o quanto o Rap no próprio movimento, possuía contradições. Justamente aí, foi que comecei a articular os conceitos de poder, verdade e saber, desenvolvidos por Michel A dinâmica das relações raciais: dados, abordagens e intersecções 106 Foucault (1979), para pensar as verdades criadas no e pelo Rap, bem como as verdades criadas no e pelo sistema de justiça criminal, os quais estão sediados nessa sociedade de normalização (FOUCAULT, 2005). 
     Sustentar que o Rap necessariamente é um instrumento “salvacionista” lhe atribui uma excessiva responsabilidade; responsabilidade esta desenvolvida através do individualismo trabalhado por Bauman (2008) nessa sociedade de liquidez, onde a responsabilização é atribuída cada vez mais ao indivíduo. 
     Por outro lado, nela também está inserida a alta visibilidade: conhecer cada vez mais o indivíduo, disciplinando-o e, com isso, eliminando as “multidões confusas” (FOUCAULT, 2009), serve em verdade como uma forma de bem governar (FOUCAULT, 1979). Na contemporaneidade, além de conhecer individualmente os corpos, a necessidade de fazer viver e deixar morrer (FOUCAULT, 2005), também se apresenta como um importante mecanismo para controlar e conhecer a população.
     Nessa perspectiva, os poderes disciplinar e biopolítico, apresentam-se como mecanismos para bem governar e o Rap, apresenta-se como um elemento potente nesse sentido. Essa afirmação se torna possível porque o Rap é um ritmo cultural desenvolvido, em sua grande maioria, por jovens, negros e moradores de bairros periféricos. Essa realidade não foge do cenário pelotense. Na passada em que se lhe atribui a responsabilidade de “resgate”, de “salvação”, o Estado que não é onipresente, vale-se desse elemento para conhecer parte da população e, consequentemente, atribuir mecanismos para controlar, vigiar, punir: para estabelecer ordem e segurança. 
     Ao me referir a arte de bem governar, valho-me do conceito de governamentalidade desenvolvido por Foucault. Ao utilizar-se da metáfora do barco, o autor pontua que bem governar não é preocupar-se somente como o artefato em si, mas com os diversos atravessamentos que lhe constituem, com as superveniências que o atingem. Nas palavras do autor: 

[...] O que é governar um barco? Com certeza é encarregar-se dos marinheiros, mas é encarregar-se, ao mesmo tempo, do navio, da carga; governar um barco é também levar em conta os ventos, os baixios, as tempestades, as intempéries. E é esse relacionar-se aos marinheiros que é preciso salvar junto com o navio, que é preciso salvaguardar junto com a carga que é preciso levar até o posto, e suas relações com todos esses acontecimentos que são os ventos, os baixios, as tempestades, as intempéries. É este pôr em relação que caracteriza o governo de um barco. (FOUCAULT, 2012b, p. 284). 

É nessa passada, atravessado por diversas legislações, por projetos culturais, conforme se verá abaixo, que o Rap tomou outras dimensões, alcançou outros ouvidos e, atualmente, causa sonoridades ruidosas nos mais diversos locais e das mais diversas formas. “Bater na mesma tecla 24 horas” (Gagui IDV – componente da Segunda geração), talvez não cause efeitos de contestação, NORUS – v4, n.5, jan - jul 2016. 107 justamente porque se tornou um mecanismo para bem governar, por outro lado, deixar de trazer a sua ancestralidade, descaracterizaria um dos importantes elementos de sua constituição, por isso o constante embate. Nesse sentido:

[...] na nossa época a gente falava muito de crime, só que a gente lutava contra o crime, contra essa coisa assim, da violência policial nas periferias e tal; hoje a gurizada do Rap de hoje eles lutam pra mostrar que pode fumar maconha onde eles quiserem, que eles podem beber cachaça onde eles quiserem. É diferente do que a gente pregava antigamente [...]. (Jair Brown – componente da Primeira geração) [grifos nossos]. Tinha como falar outra coisa, não só falar só de problema, de tiro, de facada, entendeu? Foi o que me fez querer fazer Rap mesmo, entendeu. Vi que dava pra fazer uma coisa diferenciada do que tava acontecendo. Vi que tinha outra porta pro Rap, tá ligado? [...]. Acho que o que mais inspira é a vida, mesmo, tá ligado? (Pok Sombra – componente da terceira geração).

     Como os compositores são desse mundo e atravessados pelas verdades desse tempo, suas subjetividades também são atravessadas pelas produções midiáticas, pelas pesquisas efetuadas pelos mecanismos de governo, as quais produzem verdades. O Rap composto por jovens, do sexo masculino e negros, com um estilo próprio, como calças largas, boné aba reta e uma música com uma batida “pesada”, ainda é um ritmo “marginal”. Seus sujeitos ainda continuam sendo alvo de uma recorrente discriminação, como se verá nas falas e nas rimas dos compositores. 
     Nessa passada, pensar essas caracterizações frente às regras jurídicas que se dizem aplicáveis a todos de maneira isonômica, apresenta-se como um mecanismo potente para discutir as verdades jurídicas formadas a longa data. Assim, convido o leitor para abordar os conceitos de verdade, poder e norma, antes de adentrar especificamente no enunciado “virtualidades”, buscando esclarecer a ligação do Rap e seu discurso de resistência ao sistema de justiça criminal. 

     VERDADES, PODER E NORMA: O SISTEMA JURÍDICO COMO MECANISMO DA TEIA DE PODER 

     Ao pensar o direito de forma mais restrita, sabe-se que é uma área do conhecimento que produz verdades há longa data. As leis criam subjetividades, formulam preceitos que induzem segurança e ordem. Preceitos como dignidade humana, igualdade, devido processo legal, são designados juridicamente como “princípios” que atravessam o ordenamento jurídico; devem ser respeitados por todos os ramos do direito e suas instituições (REALE, 2007). 
     O Rap, como pontuado acima, recorrentemente, desestabiliza essas verdades, embora sejam os seus compositores – e talvez por isso mesmo – atravessados por elas. Logo, questionar essas verdades jurídicas e as formas como foram construídas, a partir das rimas do Rap, torna-se A dinâmica das relações raciais: dados, abordagens e intersecções 108 uma importante ferramenta para pensar a construção jurídica. Dessa forma, de início, destaco que não parto da ideia que as coisas estão “desde sempre aí” (VEIGA-NETO, 2011, p. 11), ou que exista um “jamais dito” (FOUCAULT, 1995, p. 28).
     Entendo que a verdade é desse mundo, construída a partir de inúmeros embates de força, de saberes e poderes que irrompem na ordem discursiva e, assim, passam a ser reproduzidos como tal. Isso não significa que verdades outras não existam, entretanto, nem tudo pode ser dito em qualquer lugar, por qualquer pessoa, como pontua Foucault (2012a). Nas palavras de Nietzsche (2008, p. 36-37): 

O que é, pois, a verdade? Um exército móvel de metáforas, metonímias, antropomorfismos, numa palavra, uma soma de realizações humanas que foram realçadas poética e retoricamente, transpostas e adornadas, e que, após uma longa utilização, parecem a um povo consolidadas, canônicas e obrigatórias: as verdades são ilusões das quais se esqueceu que elas assim o são, metáforas que se tornaram desgastadas e sem força sensível, moedas que perderam o seu valor de troquel e agora são levadas em conta apenas como metal, e não mais como moedas. Ainda não sabemos de onde provém o impulso à verdade: pois, até agora, ouvimos falar apenas da obrigação de ser veraz, que a sociedade para existir, institui, isto é, de utilizar as metáforas habituais; portanto, dito moralmente: da obrigação de mentir conforme uma convenção consolidada, mentir em rebanho num estilo a todos obrigatório. [grifos do autor]. 

     Ao discutir o conceito de verdade, busco destacar que instituições, processos, sujeitos, foram e são construções que tiveram emergência em algum momento porque ascenderam na ordem discursiva, se cristalizaram, mas que podem desaparecer, estarem mais ou menos em evidência, etc: “[...] A verdade é deste mundo; ela é produzida nele graças a múltiplas coerções e nele produz efeitos regulamentados de poder” (FOUCAULT, 1979, p. 12). 
     Assim, alguns saberes são silenciados, considerados desqualificados para entrarem na ordem discursiva, mas eles não deixam de existir. Talvez seja necessário aproximar a lupa e olhar para o Rap como um desses saberes; um saber que causa ruidosa sonorização em meio a tantos outros estilos musicais, em meio a tantas outras instituições dotadas de mecanismos sofisticados para prever estatísticas, dizer quais políticas devem ser adotadas para conter a “violência”, o “risco”; produzir “ordem”, “segurança”. Talvez o Rap, possa ser o “ronco surdo da batalha” (FOUCAULT, 2009, p. 291), nestes tempos da alta visibilidade. 
     Nesse embate quanto ao que pode ou não ser dizível, é importante pontuar as articulações de poder para a emergência ou o silenciamento de algum discurso. Dessa forma, fundamentando-me em Foucault, mais uma vez, não entendo que poder seja algo que se detenha, mas algo que se exerce. Logo, não entendo as verdades produzidas pelo direito como mais “verazes” do que as NORUS – v4, n.5, jan - jul 2016. 109 produzidas pelo Rap, pelo contrário, acredito que são elementos que se articulam, que se chocam, e nesse embate, criam verdades e se matem na ordem discursiva, ambos criando subjetividades. 
     Por poder, destaco o entendimento de Foucault, do qual comungo:

[...] o poder nasce de uma pluralidade de relações que se enxertam em outra coisa, nascem de outra coisa e tornam possível outra coisa. Daí o fato de que, por um lado, essas relações de poder se inscrevem no interior de lutas que são, por exemplo, lutas econômicas ou religiosas. Portanto, não é fundamentalmente contra o poder que as lutas nascem. Mas, por outro lado, as relações de poder abrem um espaço no seio do qual as lutas se desenvolvem. [...] Mas é preciso voltar a situar as relações de poder no interior das lutas, e não supor que há, de um lado, o poder e, de outro, aquilo sobre o qual ele se exerceria, e que a luta se desenrolaria entre o poder e o não poder. (FOUCAULT, 2012b, p. 271). 

     Nas tramas do poder é que a resistência se exerce, portanto. Justamente nessa perspectiva que cheguei ao discurso de resistência exercido pelo Rap pelotense ao sistema de justiça criminal. Sistema esse que visa a “média” (EWALD, 2000), busca conter o “risco”, gerar segurança e ordem, conceitos estes tão presentes na sociedade de normalização. Para conceituar norma, valho-me das palavras de François Ewald (2000, p. 86): 

[...] A norma permite abordar os desvios, indefinidamente, cada vez mais discretos, minuciosos, e faz que ao mesmo tempo esses desvios não enclausurem ninguém numa natureza, uma vez que eles, ao individualizarem, nunca são mais do que uma expressão de uma relação, da relação indefinidamente reconduzida uns com os outros. O que é uma norma? Um princípio de comparação, de comparabilidade, de medida comum, que se constitui na pura referência de um grupo a si próprio, a partir do momento em que só se relaciona consigo mesmo, sem exterioridade, sem verticalidade. [grifos: itálico do autor, negrito, nossos]. 

     Destaco, assim, como o Rap é um importante artefato cultural para pensar as sólidas paredes jurídicas, o quanto é um ritmo musical atravessado por suas ancestralidades afrodescentes, composto em sua grande maioria por jovens, negros e do sexo masculino, os quais ainda apontam como as principais vítimas de homicídios no Brasil, da mesma forma, ocupam a maior população do sistema carcerário. 
     Dessa forma, percebo como o Rap pode ser um instrumento para repensar o que é igualdade, dignidade humana, quem esses conceitos atingem. Ainda: como pode ser um instrumento de conhecimento nessa sociedade da alta visibilidade, onde nada, absolutamente nada, está fora da norma. 

     “VIRTUALIDADES” UM ÁTOMO DO DISCURSO DE RESISTÊNCIA DO RAP AO SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL 

     A dinâmica das relações raciais: dados, abordagens e intersecções 110 Falar em sociedade de normalização, um conceito destacado por Foucault (2005, p. 46), é preciso ter em mente que se está a discutir a imbricação do poder disciplinar com o biopoder, isto é, trata-se do corpo individualmente através do poder disciplinar, ao mesmo tempo, é atravessado pelas regras vigentes em sociedade, por meio dos mecanismos bipolíticos. 
     Nada foge ao poder, nem mesmo o corpo (FOUCAULT, 1979, p. 27); precisa-se conhecêlo, particularizá-lo, quebrar com qualquer continuidade que se tenha a ingenuidade em acreditar existir: “[...] o verdadeiro sentido histórico reconhece que nós vivemos sem referências ou sem coordenadas originárias, em miríades de acontecimentos perdidos” (FOUCAULT, 1979, p. 29). 
     Por outro lado, é através de uma “felicidade ignorante” (Idem) que se busca construir ordem e segurança; essa felicidade é uma das peripécias do desejo e do poder. Traçar essas linhas para falar sobre o enunciado nomeado como “virtualidades” se faz necessário, porque, a partir de Michel Foucault (1996), as “virtualidades” foram uma invenção do século XIX com significativa potência para o sistema de justiça penal da época, a fim de prolongar a atualidade, tornar as coisas descritivas através do exame; tornar o indivíduo um dado. Com isso, passou-se às probabilidades: designar sujeitos como mais propensos ao cometimento de certos delitos foi uma resultante dessa invenção. 
     Ao olhar o presente e pensar sobre isso, é possível verificar a potencialidade dessa invenção moderna ainda nos dias de hoje. Alguns estudos da sociologia da violência são precisos em destacar esse aspecto. O pontuado por Michel Misse (2014; 2010) como “Sujeição Criminal” é um exemplo. Não se trata somente de rotulações e estigmas, mas da concepção de que certos sujeitos nasceram criminosos; o crime é sua marca principal. 
     Rapidamente é possível pensar no “Mapa da Violência – Juventude no Brasil” (WAISELFISZ, 2014) e no “Projeto juventude e prevenção da violência” (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2010). Jovens, negros e do sexo masculino são as maiores vítimas do crime de homicídio do país. Ainda pensar naquilo que Foucault (2005) enfatiza como o “direito de deixar morrer e fazer viver”, na sociedade de normalização; uma forma de efetuar esse “corte” entre “deixar” e “fazer” viver, dá-se através do racismo. 
     Essas diferenciações também são apontadas pelo Rap pelotense: 

Filho da luta, da escravidão, neto do açoite e da servidão. Herdeiros da sorte, da dor e da morte. Chibata, corrente, mordaça, chicote. Quilombo, esperança do ritmo e dança, flor da senzala, canção de criança. Brinda a arte e seu standart, lanceiros, guerreiros, imagem no embate, compadres da prosa e da poesia, do verso e do caos, da melodia, mães de nações, afilhados da lida, trabalho pesado, quilombo da vida, da carne, do sal, do canavial, café com Brasil, açúcar, cacau, o sangue humano também na boiada, da filha escrava que foi abusada, da filha escrava que foi abusada. (Radox – Parentela – primeira geração). 

     As políticas e legislações vigentes são de suma importância para que, atualmente, seja possível falar sobre acontecimentos históricos, mas também permitem a criação de novas subjetividades e, a partir disso, a possibilidade de referir dado assunto – o racismo, por exemplo – ignorado anteriormente, diante da pretensa harmonia entre as raças. Por outro lado, vê-se que aquilo que Florestan Fernandes (1965) nomeou como “democracia racial” ainda vige nos dias atuais, justamente tomando como foco as virtualidades, a sujeição criminal. 
     Isso coloca sob análise, por exemplo, o princípio constitucional da igualdade, o qual determina o mesmo tratamento legal a todos os cidadãos, independentemente da cor, idade, classe ou gênero (ADORNO, 1995, p. 46). Alguns rapper’s vão justificar suas falas porque possuem familiares em conflito com a lei, outros vão sinalizar que “tomar batida por nada” foi ou é recorrente seja por causa de seus dreadloks, pela cor da pele, das suas calças largas ou ainda porque isso faz parte do meio onde estão inseridos. 
     Entendendo o Rap como produtor do discurso de resistência frente ao sistema de justiça criminal, o questionamento a essa igualdade foi recorrente e de forma diferenciada, tendo em vista os tempos de vivência dos entrevistados, os locais de suas enunciações e como são atravessados por essas questões. Cabe destacar: “Ficou ferido, vários buracos no peito, não saiu do local, não tem nem jeito, quebrada violenta. Eu sou tipo suspeito, a Glock bloqueada e a ninja na cabeça dobrada, essa noite vai render alguma coisa, cara.” (Brown - Ninjas e Glócks – primeira geração). 
     Ou ainda: “Cara pra bater, mas sem covardia, o tapa vai doer, barriga vazia, é perna pra correr, fé no novo dia, se não fosse a D. Ieda eu não conseguiria [...] Rap é bandeira branca.” (Pok Sombra – Reconstruir – terceira geração). 
     Aqui mais uma vez, percebe-se o constante embate de forças na formulação dos ditos, o que permite repensar o que é o “protesto” que se entende ser o Rap formulador. Como o direito forma parte de nossas subjetividades e o quanto ignora alguns saberes, os quais, sim, falam do direito e diagnosticam formas outras para pensá-lo e que também atravessam os indivíduos. Por outro lado, não é possível se desvencilhar da constante imbricação entre “raça, crime e justiça” (ANDRADE, ANDRADE, 2014. p. 258) na sociedade contemporânea e o quanto isso ainda cria subjetividades em nossos tempos, como se a associação entre crime e raça, crime e juventude, estivessem intimamente ligadas. Culturalmente está, como se percebe; porém, vale lembrar: são verdades fabricadas na e pela cultura de um tempo. Não há nada de essência aí! Os mapas da violência destacam esse aspecto e os autores aqui citados também; da mesma forma e ratificando isso, estão os ditos proferidos pelos entrevistados. 
     
Desculpa as outras quebras, mais o pico é Pelotas, que faz 200 anos e pro gueto vira as costas, as mesmas que sofriam com os chicotes nas Charqueadas, hoje segue sofrendo os cassetetes dos Brigada (Gagui IDV – Pelotas 200 anos – segunda geração). Essa é pelos que nunca foi ouvido, por quem nunca foi visto e se não foi nós, nós seguia esquecido. Eu lido com situações de descaso, com o ser humano, pois, ser humano é mais que dar esmola ao desfavorecido. (Pok Sombra – Retrato – Terceira geração). 

     Percebo que mesmo antes do cometimento de qualquer delito, sofrer com “os cassetetes dos Brigada” é um fato enfrentado por parcela da população, como enfatiza Gagui IDV. As “virtualidades” visam a “média” (EWALD, 2000), em verdade; buscam instaurar a ordem. No instante em que essa “média” não é alcançada, o medo, o risco, tomam proporções significativas e a “sujeição criminal” é a melhor resposta para a contenção, para “esquecer-se”, para a previsão, para a tomada de medidas de contenção. 
     Olhar o Rap hoje se desvencilhando dessas “associações” torna-se ainda extremamente difícil, porque os atravessamentos culturais que nos perpassam, fazem com que a ligação “a questão da marginalidade” ainda seja pulsante, também porque se têm os resquícios do período escravocrata e a defesa de uma democracia racial. Além disso, evidencia-se o quanto as marcas do preconceito estão em vigência em nossos tempos. 
     Disparidades estas destacadas seja nas entrevistas, seja nas músicas, que reforçam a potencialidade do discurso de resistência ao sistema de justiça criminal, pois este preza pelo rechaço das discriminações em seu texto legal, através de diferentes dispositivos. Com base nos textos jurídicos, não se falaria em “virtualidades”, por outro lado é justamente pela suposta segurança que as determinações legais visam atingir, que as “virtualidades” se tornam potentes e justificáveis. 
     
Me dá licença, to chegando, vim buscar meu espaço, se quiser ser meu amigo, aperta a mão, dá um abraço. Se não gostar do meu estilo, nada posso fazer, sigo a estrada rap’ampeando com muito prazer. (Radox - Rap’ampeando – primeira geração). 

     Hoje é possível falar na “busca de espaço”, mas nem por isso na inexistência de uma negação de estilo. É importante sinalizar, que não é somente a questão da negritude que é enfatizada no Rap, mas as condições de ser rapper. Ligado Branco Radical, componente da primeira geração, sinaliza nesse sentido: “Roupa larga, escutando Rap, eles [policiais] diziam ‘não, não pode, não pode, tão atrapalhando as lojas’, mas a gente sabia que era preconceito, mas era um foco de resistência, hoje ainda tem uns focos de resistência”. 
     Importante destacar que o preconceito atinge toda a população, pois se está inserido nesse regime de verdade. Desvencilhar-se dele é que se torna difícil. 

Eu entendo, tem um certo preconceito e em determinado momento eu aceito esse preconceito, aceito esse preconceito pelo seguinte, não é aceito esse preconceito, entendo esse preconceito: pelo fato de que, cara, tem uma velharada danada da direita, uns caras ricos de sobrenome em Pelotas, os caras não tão acostumados com isso. Não é que eu aceito, eu entendo esse preconceito. Os caras vão chegar lá, eles vão ver um negão, tá ligado? Que nem ontem, eu fui atender uma cliente minha que eu tinha que atender ontem, eu cheguei dez minutos antes no meu escritório e ela tava me esperando, “ah, é tu o Luiz Vagner”, tipo, “é tu?”, “sim, sou eu minha senhora, fica a vontade”. (Luiz Vagner – componente da segunda geração). 

     Essas criações atravessam a sociedade e são reforçadas, cotidianamente, pelos mais diversos mecanismos do poder em vigência, porque estão sedimentadas como uma verdade potente; não se discute mais essas “metáforas” como pontuava Nietzsche (2008, p. 37), e assim “mentimos em rebanho” aceitando certos ditos como se de fato fosse justificável, compreensível a discriminação. 
     Sérgio Adorno (1995, p. 47), sinaliza: “O que parece diferenciar a sociedade brasileira de outras sociedades é a extrema tolerância que temos para com esta forma de discriminação”. Vejo que a média é procurada por todos, inclusive por quem sofre o preconceito de forma direta, pois também está permeado pelas regras de normalização, também está inserido nesse regime de verdade; é deste mundo e não de outro. Frise-se que a “marca”, a cor da pele, é algo que não vai poder ser disfarçada, transposta, ocultada, por isso seus efeitos são ainda mais pulsantes. Por outro lado, fazer com que o Rap seja reconhecido, que as calças largas, dreadloks, boné aba reta virem moda, se banalize, é uma maneira de inserção na e pela norma: nada lhe é estranho. Ainda, isso não significa que alguns desses sujeitos não sejam conhecidos como anormais – dentro da norma, mas sem as características da média. Logo, o que não é média, o que causa estranheza, necessita de cuidado, de atenção, pois pode ser um fator potente para o risco, causador de insegurança, etc. 

[...] os caras falam pra mim, “pô magrão, escuto a tua música, achei que tu fosse um negão de dois metros”, os caras me falam, “pô, escutei, bah música pesada, fui te conhecer e tu oclinhos, carinha de crente, intelectual”, os caras falam. Quer dizer... Na verdade isso se cria. [...] Porque pelo boné, pela roupa que ele usa ele é do Rap, hoje em dia se banalizou demais, não tem mais. Os caras do Rap também deixaram de usar aquelas roupas largas, também mudou muito isso aí. (Gagui IDV – componente da segunda geração). 

     Isso sinaliza outros fatores: uma coisa é um sujeito estar com calça larga, boné, etc, no centro da cidade e o olhar que a ele se lança; outra, bem diferente, é essa mesma caracterização nos bairros da cidade (FELTRAN, 2014, p. 302). Uma coisa é moda, outra é “sujeição criminal”. Ambas caracterizam o regime de verdade no qual se está inserido, ambas demonstram os mecanismos do poder em atuação. Isso ajuda a construir aqueles índices de onde há maior ou menor A dinâmica das relações raciais: dados, abordagens e intersecções 114 violência, não só pelos fatos ocorridos, mas pelas características dos sujeitos que habitam certos locais. Isso também foi uma das grandes inovações da reforma penal do século XIX e ainda em vigência na contemporaneidade. 
     Não há que se olvidar da seletividade do sistema de justiça criminal, especialmente, do direito penal (SINHORETTO, 2014, p. 404), isso não somente como um exercício negativo do poder, é importante deixar claro. O mesmo poder que diz não, também produz ordem, cria expectativas, ajuda a barrar o medo, mesmo que para isso, alguns sejam mais condenáveis do que outros (FACHINETTO, 2011). Ao mesmo tempo em que o Rap recebe o rótulo de um “saber marginal”, para muitos foi e ainda é um mecanismo que auxilia a ultrapassar as barreiras do crime; ainda cumpre essa missão de “salvação” para algumas vertentes do Rap pelotense. 

Claro, pro social. Aí justamente, porque eu mesmo fui criado ali na Guabiroba, na vila, e andava com os caras de vila e os caras era treta, né mano? Já roubavam, já faziam essas fitas aí e tá, foi nessa época que eu conheci o Rap. (Ligado Branco Radical – componente da Primeira geração). 

     Pensar em certas atitudes já enseja pensar no possível cometimento de crimes, imagine-se, então, se seus amigos são “treta”. Já dizia aquele antigo ditado, “me diga com quem andas, que te direi quem és”, não é mesmo? “Cientificamente” falando: 

[...] O saber policial informal, baseado em visões etiológicas do crime que aliam traços de racismo científico a teses ecológicas, acredita poder reconhecer os criminosos em seus sinais, hábitos, linguajar, vestimenta, locais de circulação. (SINHORETTO, 2014, p. 406). 

     Ainda: 

Quantas vezes eu tava na rua com um monte de gente, eles pararam eu e deixaram todo mundo ir passando, tá ligado? Talvez pelo meu estereótipo, tá ligado? [...] Quantas vezes! Tomar porrada na rua, falar “porra, mas o quê que eu fiz? O que quê eu to fazendo? Porque tu tá fazendo isso? Tais abusando do teu poder!” “cala a boca, cara! Não olha pra trás”, não deixa olhar o distintivo, não deixa olhar o nome do cara, não deixa olhar a cara dele, tá ligado? Ele te caga a pau e foda-se. Te enche a bico e vai indo, tá ligado? (Pok Sombra – terceira geração). 

     Ao transpor o conceito de virtualidades, torna-se justificável a abordagem da qual Pok Sombra se refere, ao mesmo tempo em que coloca em suspenso algumas verdades jurídicas, como igualdade, dignidade da pessoa humana, devido processo legal, inocência até o trânsito em julgado da sentença. Por outro lado, o quanto se torna caro pensar que um policial efetuaria uma abordagem em determinado sujeito, pelo simples fato de vestir-se de determinada forma ou então habitar certo local. Em outra perspectiva, porém, isso aparece como uma obviedade, onde se sustenta a “sujeição criminal”, onde há o rótulo de “pessoas do bem” e “pessoas do mal”: 

[...] Eu o temo, por isso o persigo – não se trata apenas de estigma ou preconceito, nem de rótulos, mas de riscos, regras de experiência, conflito. Nesse caso, não há negociação possível, há medo, pavor e ódio. E o estigma e os preconceitos, agora SIM, se generalizam [grifos do autor] (MISSE, 2014, p. 207). 

     Nota-se que tanto Misse (2010; 2014), Bauman (1998; 2008) como Foucault (1997; 1996; 2005; 2009), sinalizam a existência de uma busca por ordem pulsante na sociedade moderna. Esses mecanismos de contenção, criados com o poder disciplinar e com o biopoder, disseminaram-se através da norma e com isso o permanente desejo de segurança. 
     Tende-se a justificar aquelas condutas destacas por Pok Sombra porque culturalmente construiu-se isso como verdade (MISSE, 2010, p. 17). É necessário para prever ordem efetuar “revistas” em determinados sujeitos e justificar – ainda mais se forem jovens e negros, ou ainda se eles forem um “típico neguinho brasileiro de esquina, tá ligado? Cresci numa comunidade tri carente, tá ligado?” (Zudzilla – componente da terceira geração) –, caso nada seja “encontrado”, que alguém muito parecido com o “revistado” foi denunciado pelo cometimento de algum crime. É preciso ordem. É preciso conhecer. É preciso conter o risco. 
     Possível perceber, assim, que as “virtualidades” não são só da ordem da repressão, mas da segurança, da previsibilidade, da possibilidade de ordem. Alguns sujeitos, porém, as sentem da pior forma possível, lhes sendo “tirada a vida”, como assentia Foucault (2005), mesmo que de forma indireta, negando-lhes direitos, por exemplo. É assim que se evidencia o quanto o Rap se aproxima do direito, o quanto é importante discutir “metáforas” que foram transformadas em grandes verdades, o quanto o poder está imbricado em diferentes mecanismos, se exercendo de diferentes formas. O quanto se está inserido na norma e como esses atravessamentos constroem subjetividades.

     CONSIDERAÇÕES FINAIS

     Ao longo do texto, na esteira de Michel Foucault, busquei desestabilizar certezas e questionar verdades, trabalhando com os conceitos de “verdade”, “poder”, “norma”, conceitos estes articulados para poder pensar no/para/do direito e suas produções e reproduções sociais, bem como no Rap, evidenciado a sua ligação com essa “ciência”, o quanto reproduz certos conceitos criados por ele – direito – e o quanto questiona algumas de suas verdades. 
      Evidenciando alguns ditos produzidos por compositores de Rap, na cidade de Pelotas/RS, busquei colocar-me à retaguarda de algumas verdades produzidas pelo sistema de justiça criminal, o quanto se sujeita saberes, se rotula sujeitos e se sustenta abstrações. Essas mesmas questões que, a princípio, são repudiadas, causam ordem e segurança, elementos constantemente buscados na sociedade de normalização. 
     Assim, busquei enfatizar o quanto o direito é um artefato cultural que produz subjetividades, mas que não está desde sempre aí, pelo contrário, é atravessado pelas articulações de poder e saber de uma época. Nessa linha, o Rap, como outro artefato cultural, pode ser um potente instrumento para questioná-lo e pensar verdades outras no presente. 

     REFERÊNCIAS 
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