Gestão em educação: onde fica a ERER?
Patrícia da Silva PereiraMestra em Educação/FACED/UFRGSProfessora da RME-POA/RSDOI: 10.31560/pimentacultural/2021.515.284-305
INTRODUÇÃO
A EDUCAÇÃO NA CONSTITUIÇÃO
A Educação no Brasil é fundamentada na Constituição Federal de 1988, sendo um direito de todos os indivíduos (Art. 5º), fundamental para a organização de uma sociedade minimamente civilizada e humanamente viável. Em seu bojo, também aponta as responsabilidades compartilhadas dos Entes Federados, traçando as responsabilidades do Governo Federal (através do Ministério da Educação/MEC), dos Estados e Distrito Federal (através das suas Secretarias Estaduais de Educação), e dos municípios (através de suas Secretarias Municipais de Educação), de forma bem explicitada.
O Art. 5º da Constituição Federal de 1988 aponta que “a educação, direito de todos, é dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. É uma prática social que visa o desenvolvimento do ser humano, formando cidadãos adultos, no futuro, apostando em suas potencialidades, habilidades e competências.
E, como diz nossa Carta Magna, não se restringe ao espaço escolar formal: a família é co-solidária nessa responsabilidade de formação, de construção de conhecimentos e de organização de nosso futuro a partir de suas crianças.
Duarte (2004) ressalta, contudo, que o direito à educação, previsto na Constituição de 1988 não engloba tão somente o direito do cidadão em cursar o Ensino Fundamental para obterá oportunidade de crescer profissionalmente e assim ajudar no desenvolvimento econômico do país, mas, sim, objetiva oferecer condições para o desenvolvimento pleno de inúmeras capacidades individuais, não devendo jamais se limitar às exigências do mercado de trabalho, mas propiciar que um cidadão cresça e se expanda no plano intelectual, físico, espiritual, moral, criativo e social. (CAMARA, 2013, p. 14)
Nesse mesmo documento organizador da gestão e convivência de nosso país, há alguns objetivos simples, que demandam toda a atenção de quem atua no espaço de Gestão da Educação, e que suscitam questionamentos basilares a quem atua na Gestão da Educação para as Relações Étnico-Raciais/ERER. Quando a Constituição Federal de 1988 nos aponta a “garantia ao pleno desenvolvimento do indivíduo”, qual o perfil deste indivíduo? Qual sua origem, sua etnia, sua ancestralidade, onde mora, com quem mora, que cosmovisão de mundo seus familiares estão lhe apresentando?
Ao enunciar que a educação deve “prepará-lo para o exercício da cidadania”, questiona-se qual cidadania, e se esta sociedade para a qual preparamos nossa próxima geração reflete seu real cidadão. Se não sabemos quem educamos, será que sabemos para qual sociedade e para qual exercício de cidadania formamos? Sob qual visão de mundo? E, ao prospectar que tal atividade, de anos e anos de aprendizagens e experiências escolares, deve preparar este jovem cidadão para o Mercado de Trabalho, observando as diferenças nos espaços educativos proporcionados às diferentes classes sociais, e as diferenças raciais tácitas dos que as frequentam, há de se questionar para quais papéis estarão sendo preparados cada um deles. Estamos garantindo um papel de liderança e exercício de poder aos frequentadores das Escolas das elites, das classes mais abastadas, e os papéis de subalternidade e obediência para a grande maioria das crianças, presentes nas Escolas públicas, em especial as situadas em periferias?
Há de se fazer algumas reflexões sobre esta Educação apresentada na Constituição Federal de 1988 e outras legislações educacionais, pensado na realidade do que se oferece à grande maioria dos brasileiros, precisamos exatamente pensar que brasileiros são estes. Afinal, de que brasileiros estamos falando? Qual a cor/raça da maioria da população brasileira? Como estes brasileiros são mostrados nos Livros Didáticos, desde as escolhas das imagens até sua participação na construção da história do país? Quais as referências que estas crianças, oriundas da grande maioria Negra da população (entre Pretos e Pardos, como definido pelo IBGE), têm ao longo do processo de escolarização?
Quantos Professores negros eles terão como referência positiva dentro das escolas, ao longo de, pelo menos, 14 (catorze) anos de permanência obrigatória na escola? Será que, realmente, a educação no Brasil reflete o seu povo? São muitos questionamentos necessários a quem pensa em orientar as ações de outros tantos Educadores. Os processos educativos, dentro ou fora das instituições escolares são, portanto, inevitavelmente marcados pelas especificidades dessas relações raciais. Tal marcador social exige do campo de pesquisa em Educação uma contínua composição com o debate acadêmico construído acerca de categorias sociais como raça, racismo e racialização, inconcluso e de extrema relevância social. (MEINERZ, 2017, p. 233)
Como costumo afirmar em Palestras, Formações e Reuniões com Professores da Rede Municipal que atuo, com outras Redes de Ensino, Escolas privadas e Instituições de Ensino Superior que formam novos Professores, o Professor que atua na Gestão da Educação deve sim ter muitas questões na cabeça, diariamente. Não só respostas prontas ou planos pré-traçados, mas questionamentos que o motivem a buscar conhecer cada vez mais o “para quem” se faz nossas atividades, e onde queremos que estes jovens cidadãos se vejam e o quanto eles se verão no contexto cotidiano, de forma positivada e afirmativa. Há quatro questões que sempre me faço quando estou preparando qualquer planejamento, e que deveriam estar na memória dos professores, cotidianamente: 1) Que escola é esta? 2) Que educação é esta? 3) Que cidadãos estão sendo formados aqui? E 4) Que sociedade estamos construindo? Porque, se a Escola não reflete a presença e história da sua comunidade escolar, ela está refletindo quem no seu currículo? Qual história? Somente a história e perspectiva dos colonizadores?
Somos um país Negro! Sim, somos o maior país de população afrodescendente, de africanos em diáspora, fora de África, fora do seio do Continente-Mãe! Todo o processo de mercantilização dos diversos Povos Africanos sequestrados, vendidos e trazidos a ferro para o nosso país, além das torturas, exploração e violências aqui impostas pelos colonizadores europeus, deixaram marcas indeléveis na estrutura de nossa sociedade. O racismo é o eixo central da economia racializada, desde o Período Colonial. Nunca houve uma emancipação real dos africanos e seus descendentes, nem indenizações ou inclusão social real e digna, que possibilitasse a estas pessoas mitigar o desequilíbrio econômico e social que mais de 300 anos de escravização lhes impuseram.
Incrivelmente, mesmo sendo maioria da população, somos chamados de “minorias”. Não minorias quantitativas, apesar da invisibilidade total nos espaços de poder e espaços de Gestão das Políticas Públicas, em todos os níveis de todos os espaços decisórios. Mas somos as minorias de direitos, os que menos acessam os bens produzidos socialmente, mesmo que ali sejamos a maioria da mão-de-obra básica. Somos os que menos acessam os serviços públicos, mesmo que gratuitos e que estejam dentro das comunidades periféricas. Não se trata de um impedimento legal ou tácito, mas de não sentir-se parte da sociedade, do sentido de exclusão, do sentimento de “Não-lugar”, de não ser digno de merecer usar tais espaços. Inclusive, por muitas vezes, ser tratados como cidadãos de 2a linha, com desdém ou menos consideração (até um racismo direto, declarado mesmo), como muitas Pesquisas, livros e Teses já apontam (SILVA, 2009; SILVA e AÇO, 2018; ALMEIDA, 2013; PRIMO e FRANÇA, 2020), há décadas.
Mulheres, Negros, Indígenas, LGBTI’s, Idosos, Pessoas com Deficiência, Ciganos e outras minorias étnicas, Refugiados (em especial, os vindo de África e do Oriente Médio) são a base da base da pirâmide social, como já apontado pelo IBGE (Há diversos artigos e materiais disponíveis sobre as pesquisas econômicas, e relações entre desigualdade econômica e racial no site do IBGE, numa área chamada Educa IBGE. Disponível em: https://educa.ibge.gov.br/jovens/materias-especiais/21039-desigualdades--sociais-por-cor-ou-raca-no-brasil.html). Estão à margem de tudo, sendo obrigados a empreender muito mais esforço e tempo para “furar” as barreiras sociais, e ascender socialmente, saindo das linhas de Pobreza e extrema Pobreza, onde são a grande e gritante maioria, historicamente.
Como exemplos, segundo os dados de 2013 do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA, 2013), os negros e as negras são os mais vulneráveis às violências sociais, possuem 3,7 mais chances de serem assassinados em relação Às pessoas brancas, sofrerem racismo no mercado de trabalho e no processo de desenvolvimento educacional, com o preconceito, a discriminação social e racial. Os negros constituem o grupo social em que os índices de homicídio no país vêm aumentando desde o ano 2002. Conforme estudos divulgados pelo “Mapa da Violência 2012: a cor da violência no Brasil”, de 2001 a 2010, enquanto os homicídios da população jovem branca caíam em 27,1%, os homicídios de jovens negros cresceram 35,9%. Somente no ano de 2010 cerca de 35 mil jovens negros foram assassinados no país. (RODRIGUES, 2014, P. 09)
A ERER E A EDUCAÇÃO ANTIRRACISTA
Apesar de parecerem ter o mesmo foco, há diferenças entre os conceitos de ERER – Educação para as Relações Étnico-Raciais -, e a Educação Antirracista. Explicitado pela Professora Dra. Carla Beatriz Meinerz (2018), em um dos seus vários estudos sobre a temática, esta afirma que:
A definição conceitual de ERER explicita-se oficialmente no Parecer do Conselho Nacional de Educação/Conselho Pleno (CNE/CP) 03/2004, alinhada à ideia de combate ao racismo e à discriminação racial, no cotidiano escolar. Tal Parecer aprova as Diretrizes Curriculares Nacionais e, em sua redação, observa-se a seguinte definição: “A educação das relações étnico-raciais impõe aprendizagens entre brancos e negros, trocas de conhecimentos, quebra de desconfianças, projeto conjunto para construção de uma sociedade justa, igual, equânime”. Destacamos, na presente análise, duas orientações do texto legal: a primeira, sugere o movimento de conhecimento das histórias e culturas afro-brasileiras e indígenas, através do diálogo com as comunidades tradicionais; a segunda, incentiva a participação de grupos do Movimento Negro – e Indígena, a partir da Lei. 11.645/08, sob a coordenação dos gestores e professores, na elaboração de projetos que contemplem a diversidade étnico-racial. (p. 153)
Tal compreensão não restringe a Escola, em específico, o Currículo Escolar, como único campo de disputa de narrativas históricas e sociais, na busca de processos e metodologias educacionais que contemplem, equitativa e mais realisticamente, os fatos, contribuições, participações e invenções de todos os grupos étnicos que compõem este país. É buscar, num tempo delimitado anual de atuação, especificado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN, de 800 horas e 200 dias letivos, para contemplar os Povos Tradicionais, os Africanos e descendentes de africanos, entre outras minorias étnicas, em todas as suas riquezas. E tal exercício de Gestão Educacional vai se basear em novas pesquisas, produções de conhecimentos acadêmicos, na leitura constante destas novas fontes, mais inclusivas e realistas, conclamando que não só os Gestores dos Sistemas Educacionais, mas das Escolas, além do restante da Comunidade Escolar, se assentem para pensar, conjuntamente, no que nos é caro e possível incluir no cotidiano escolar, do conteúdo à forma como são propostos aos cidadãos em formação: nossos alunos!
Ao contemplarmos a ERER extravasando os muros escolares, e ampliando o espaço de disputa narrativa e histórica, que modifica a visão de mundo de muitos grupos e Comunidades, e segue subsidiando as lutas em outros espaços de convivência, como locais de trabalho, espaços comunitários, espaços religiosos e até nos Partidos Políticos, ampliando as práticas de Ações Afirmativas. É aí que aplicamos a Educação Antirracista!
Para Sherol, a Educação antirracista ajuda na valorização da identidade e da trajetória dos diferentes povos que formam um país, em vez de tomar a visão do colonizador como a dominante. Além disso, a prática auxilia no sentimento de pertencimento dos negros no espaço escolar e acadêmico. “É uma valorização da diversidade, daquilo que distingue os grupos raciais, mas não os hierarquiza”, diz Sherol. “Uma Educação antirracista é aquela que entende que vivemos em uma sociedade racista, em que as relações entre as pessoas são pautadas também a partir do lugar social e racial que elas ocupam, e se preocupa em preparar indivíduos que possam se colocar contra esse sistema, gerador de maior desigualdade”. De acordo com ela, isso requer uma mudança não só no currículo, mas nos discursos, nos raciocínios, nas lógicas, nas posturas e nos modos de tratar as pessoas negras. (MADUREIRA, 2020, p.01)
Por isso, é necessário reeducar Professores, Monitores e os demais Trabalhadores em Educação, para que as práticas de ERER sejam de toda a Escola, em todos os espaços escolares, em momentos diversos, para além do quadro e livro. Isto é muito importante, porque precisamos sempre lembrar que somos educados numa sociedade que nos ensina a competir e a sermos preconceituosos. Somos educados a sermos machistas, racistas, homofóbicos e toda a sorte de preconceitos possíveis, desde o nosso nascimento. Mas, como sempre nos lembram as palavras de Nelson Mandela, em sua autobiografia de 1994, “Ninguém nasce odiando o outro pela cor de sua pele, ou por sua origem, ou sua religião. Para odiar as pessoas precisam aprender, e se elas aprendem a odiar, podem ser ensinadas a amar”. (MANDELA, 1994). Infelizmente, em diversos espaços de encontros de Professores Antirracistas (Encontros em Seminários, Cursos, Formações, no nosso Coletivo de Educação Antirracista do RS, surgido durante a Pandemia (2019), nos Encontros para as aulas finais das Edições do Curso UNIAFRO/UFRGS. São relatos constantes de situações de boicotes, impedimentos, proibições e interdições, as vezes, silenciosa, outras vezes não, que buscam não permitir a mitigação do racismo, em suas diferentes faces.), há relatos de uma gama de ações preconceituosas que são de incidência cotidiana na Escola, como o Bullying, a invisibilidade, as diversas discriminações e todas as formas de exclusão praticadas, que abalam a construção da autoestima das crianças. Baixa autoestima prejudica a capacidade de aprendizagem, memorização e apreensão dos conhecimentos, bem como, da construção de uma consciência crítica e a cidadania.
O racismo no ambiente escolar é também presente na evasão escolar, nos baixos índices de escolarização e defasagem quanto à relação idade e série escolar. Dentro das condições históricas e sociais, com suas formas de se construírem socialmente, enquanto sujeitos sociais, esse grupo étnico também se encontra inserido em um contexto de desumanização, proibido de ser, privado de desenvolver suas potencialidades, de viver plenamente a sua condição de ser humano dotado de direito à dignidade e ao exercício da cidadania.
Tendo por vista esses jovens como uma condição histórica e social, é possível perceber as desigualdades escolares entre indivíduos negros e brancos, ou brancos e não brancos, como parte da interdição de possibilidades e de heranças sociais que lhes foram impostas como limitadores de acesso à mobilidade social. Devido a uma questão cultural e política, por conta do racismo estrutural, da naturalização do racismo nas relações sociais refletidas no cotidiano escolar, onde de tanto o cultivar tornou-se um valor cultural e social, naturalizou-se em todos os espaços sociais (GRISA, 2011). O resultado disso reflete nas disparidades sociais seculares no país, na privação da ascensão social como resultado material da manutenção dos privilégios, do status quo e da reprodução da exclusão de vários espaços da vida cotidiana. (RODRIGUES, 2014 p. 29)
A escola, ao retratar a população negra e indígena apenas como “escravizados” ou “indolentes” ao longo da história, omitindo, deliberadamente, todas as suas ações e contribuições para a construção do Brasil, e concedendo o papel de “herói” apenas aos brancos, opta por não criar uma ligação empática com tais povos, visto que ninguém gosta de se ver ligado, historicamente, apenas a ditos “derrotados” ou “inferiores”, como é representado em alguns Livros Didáticos. É enunciar, não verbalmente, o nosso Não-Lugar! É dizer que ali não se mostram tais referências pois nada há de positivo nestas, o que não é verdade. E, como tais pesquisas mostram, além das questões de pobreza, dificuldades familiares, a não valorização do educar passa, também, e portanto, pelo Não-Lugar. Nessa perspectiva, da relação entre o racismo na escola e a aprendizagem, os Gestores da educação precisam ter em seu horizonte os dados racializados de seus alunos (Professores e demais trabalhadores na Educação, também), transversados pelos indicadores de Reprovação e Evasão. É com estes indicadores que se tem comprovado a desigualdade entre brancos e não-brancos, neste abismo de “aproveitamentos” e indicadores, que precisam se materializar em Planejamentos e Políticas Públicas que deem conta de mitigar os resultados do racismo na Educação.
O TRIPÉ NA GESTÃO DE ERER
Não há um único espaço de Gestão dentro da Educação, e isso não se dá somente na Educação Pública, mas em muitos níveis de gestão das políticas públicas e das ações e Planejamentos que envolvem os Sistemas de redes públicas e privadas. E estes níveis se relacionam, de forma direta e constante, dentro dos papéis que exercem, dentro e fora da Escola, de acordo com as legislações que delineiam o seu contexto.
De acordo com Groppo (2006), o termo gestão é derivado do latim ‘gestio’, que significa ação de dirigir; portanto, não perde a essência também estabelecida para administração. Para Cury (2007) a palavra gestão provém do latim e significa: levar sobre si, carregar, chamar a si, executar, exercer, gerar. O termo gestão tem sua raiz etimológica em ger, que significa fazer brotar, germinar, fazer nascer; desta mesma raiz provêm os termos genitora, genitor, gérmen. O termo gestão, teoricamente teve seus referenciais desenvolvidos a partir de críticas à expressão “administração”, originária do sistema fabril. (CHAVES; GUTIERRES; MENDES; RIBEIRO, 2014, p. 2)
Os autores relembram a história do surgimento da Administração, em especial, da Administração/Gestão Educacional, provinda da organização fabril dos trabalhadores durante o processo de crescimento e organização das sociedades capitalistas. Era preciso dar conta dos diferentes processos e objetivos naqueles espaços de trabalho, e para cada especificidade ou grupo de produção, “implementou-se a divisão pormenorizada do trabalho, a separação entre o pensar e o fazer, intensificando-se o controle do trabalho, originando-se daí a necessidade da gerência” (CHAVES; GUTIERRES; MENDES; RIBEIRO, 2014, p. 3), surgindo, daí, os postos de trabalho chamados “administrativos”, organizando e potencializando os resultados esperados, além das memórias das ações, de onde se podia extrair as informações referentes ao trabalho individual (horas trabalhadas, tempo, salário e demais direitos e insumos relacionados aos trabalhadores) como no extrato do trabalho coletivo (aquisição e manutenção de maquinários, insumos, etc.), além da geração de lucro. Todas estas informações e memórias precisam ser organizadas e guardadas, além de analisadas e dado os devidos encaminhamentos, cotidianamente.
Este ambiente pode ser “replicado” para o ambiente escolar e da organização dos Sistemas Educacionais, pois Gestão Escolar e Gestão da Educação são conceitos que estão um dentro do outro, as que tem suas devidas especificidades.
Os termos gestão da educação e administração da educação são utilizados na literatura educacional ora como sinônimos, ora como distintos. Algumas vezes gestão é apresentada como um processo dentro da ação administrativa, em outras, seu uso denota a intenção de politizar esta prática (GRACINDO; KENSKI, 2001). Apresenta-se também como sinônimo de ‘gerência’, numa conotação neo-tecnicista. Em discursos mais politizados, o termo gestão aparece como alternativa para o processo político-administrativo autoritário da década de 1980, e sugere “uma tentativa de superação do caráter técnico, pautado na hierarquização e no controle do trabalho por meio da gerência científica, que a palavra administração (como sinônimo de direção) continha” (ADRIÃO; CAMARGO, 2007). Mas tanto os organismos internacionais quanto os movimentos sindicais, que postulam posições mais avançadas na área, optaram pelo termo gestão, obviamente, cada um com concepções diferenciadas. (CHAVES; GUTIERRES; MENDES; RIBEIRO, 2014, p. 4)
No meu entender, a Gestão, para a concepção de Educação a que me proponho refletir e compartilhar, se apresenta como um conceito mais adequado, visto que se necessita olhar o outro como parte inerente e importante de todos os processos educacionais. O olhar da Educação em ERER é olhar o outro como parte de nós mesmos, parte da nossa história ancestral, e faz com que possamos organizar até nossas ações mais complexas da gestão de forma a refletir tais aprendizagens transgeracionais. Aliás, este é o papel que se espera de quem ocupa um espaço de poder como este (da gestão específica da ERER), mesmo sendo de um pequeno ou micropoder, que vai afetar a construção de uma comunidade, e colocar em prática as aspirações e gerações, representadas pelos Movimentos Negros e Indígenas.
É um espaço de representatividade, onde se espera de tal operador conhecimento, vivência e cosmovisão condizente com as necessidades e anseios destas comunidades organizadas, muito além de ser um mero aplicador de propostas de um determinado governo ou Diretor-Geral. O processo de ERER é um caminho de humanização que a atual forma escolarizada, no geral, não tem dado conta, por falta de um olhar mais humanamente diverso e potencializador de diferenças que nos singularizem, e não nos desigualem!
Pensando no tripé, nas três partes em que percebo a Gestão de ERER, vejo-as organizadas da seguinte forma:
Figura 1 - O tripé da Gestão da ERER.
Políticas de reparações voltadas para a educação dos negros devem oferecer garantias a essa população de ingresso, permanência e sucesso na educação escolar, de valorização do patrimônio histórico-cultural afro-brasileiro, de aquisição das competências e dos conhecimentos tidos como indispensáveis para continuidade nos estudos, de condições para alcançar todos os requisitos tendo em vista a conclusão de cada um dos níveis de ensino, bem como para atuar como cidadãos responsáveis e participantes, além de desempenharem com qualificação uma profissão. A demanda da comunidade afro-brasileira por reconhecimento, valorização e afirmação de direitos, no que diz respeito à educação, passou a ser particularmente apoiada com a promulgação da Lei 10.639/2003, que alterou a Lei 9.394/1996, estabelecendo a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileiras e africanas. Reconhecimento implica justiça e iguais direitos sociais, civis, culturais e econômicos, bem como valorização da diversidade daquilo que distingue os negros dos outros grupos que compõem a população brasileira. E isto requer mudança nos discursos, raciocínios, lógicas, gestos, posturas, modo de tratar as pessoas negras. (CNE, 2004, p. 11)
Nenhum comentário:
Postar um comentário